sexta-feira, 6 de julho de 2012

Entrevista - Maurício Rands

Caros,

Segue transcrição da entrevista concedida hoje por Maurício Rands ao radialista Geraldo Freire, na Rádio Jornal.

32 ANOS DE MILITÂNCIA

Estou vivendo um momento muito doloroso. A decisão é muito difícil de tomar. São 32 anos de militância ativa, para transformar a sociedade, pela emancipação das pessoas através da política. Essa decisão que tomei é por ter refletido que esgotou um ciclo em minha vida. Vou continuar sempre sendo a pessoa que acha que a política é um instrumento de transformação, de emancipação, mas, para mim, chegou ao limite. Já vinha com alguns descontentamentos, descontentamentos de como as pessoas, às vezes, tratam a política, generalizando como se todos fossem iguais a alguns que praticam condutas que são reprováveis. Às vezes, setores da Imprensa tratam a política e a democracia de forma desrespeitosa. Às vezes, na política e nos partidos as pessoas perdem a referência de que a política é um instrumento para o povo. Então, tem muita gente que faz a política apenas disputando cargos e espaços de poder. Cheguei ao fim de um ciclo. Mas, ao chegar ao fim do ciclo, quero dar um testemunho prático às pessoas de que a política é um instrumento de emancipação humana.

CRENÇA NA POLÍTICA

Estou mostrando que acredito na política, que sou da política e que tem gente na política que não aceita o vale-tudo, que não aceita que o fim justifique o meio, que não aceita que qualquer processo é justificativa para obtenção de resultados. Esse é o meu testemunho de alguém que acredita na política, e que deve haver respeito na vontade das pessoas, deve haver respeito à democracia interna, deve haver respeito à militância, às pessoas que dedicam suas vidas a um ideal.

IMPOSIÇÃO

Esse episódio da escolha da candidatura do PT para mim foi a gota d’água. A decisão tomada lá em São Paulo, por burocratas do meu partido, de modo autoritário, sem conversar com a militância e procurar saber qual é o sentimento do Recife e da base partidária, eles já tinham tomado antes do resultado das prévias. Cheguei a essa conclusão depois que parei para reflexão, não foi algo que ficou claro logo após a imposição deles. Eles disseram que não iriam mais permitir uma segunda prévia e, se a gente fizesse, eles não proclamariam o resultado. Sai dali dizendo que aquilo era meu limite. Mas havia a possibilidade de ter a unidade da Frente, que acho que é um valor. A unidade da Frente para Pernambuco com Lula, Dilma, Eduardo, o PT, tem feito bem à população da nossa cidade, do Estado e País. Ainda segurei meu gesto porque acreditava que podia haver unidade. Mas ali estava claro que não podia incorporar e aceitar um gesto autoritário como aquele. Impuseram, de São Paulo, uma candidatura. Seja o mérito que tem, o Recife não é cidade para receber posição de burocrata autoritariamente de São Paulo. Recife tem a história da Guerra dos Mascates, das revoluções de 1817, de 1824, da Frente do Recife, da bancada que o PCB elegeu em plena Guerra Fria. Recife é dita, por muitas pessoas, uma cidade rebelde, que tem história e não aceita uma imposição.

DIRCEU

Não teve encontro não. Apenas no diretório, quando encontrei José Dirceu, senti que o tratamento dele foi diferente, mas não teve essa troca de diálogo.

REFLEXÃO

Isso me permite explicar ao povo do Recife, de Pernambuco, que na verdade, me retirei e passei 30 dias refletindo para não tomar uma decisão no calor da emoção. Eu me retirei, mergulhei, refleti, refleti com amigos, com Patrícia, Tatiana e Diego, e quando reconstruí o que aconteceu, ficou muito claro.

ROTEIRO PRÉ-FABRICADO

Essa direção nacional do PT, a partir de São Paulo, de modo autoritário, já tinha um roteiro. Para eles, não importava se a militância do PT estava se mobilizando, discutindo a cidade, numa prévia, eles já tinham um roteiro: não podia ser Maurício. E por que não podia ser Maurício? Por aquilo que na verdade era um capital político, que tinha feito minha candidatura. É que minha candidatura tinha possibilidade grande de unir a Frente Popular. Tenho bom diálogo com Eduardo Campos, com os demais partidos da Frente. Dentro das hipóteses do PT, minha candidatura era aquela que tinha mais condição de manter a Frente unida, que tinha bom diálogo com Eduardo. A direção achava que isso deveria levar Maurício a não ser candidato. Eles tinham um roteiro previamente preparado, um modelo decisório que não concordo e muita gente não concorda. Por isso esse meu gesto.

GESTO AO POVO E AO PT

Apesar do procedimento impositivo feito pela executiva nacional, teríamos uma candidatura que seria de Humberto unindo a Frente Popular. Mais uma vez, como é valorosa para a vida do povo a manutenção dessa Frente, resolvi me conter. Aceitei a imposição, apesar de em São Paulo ter registrado minha discordância. Mas foi um gesto para ver se mantinha a Frente. Eu me recolhi para ver o que acontecia. Aí, tive certeza que o processo foi uma coisa autoritária, burocrática, uma coisa de que se eu aceitasse e incorporasse estaria aceitando a diminuição da militância do PT e da minha própria dignidade. Se não fizesse uma carta, um discurso na tribuna ou uma entrevista e esse meu gesto de sair do partido, eu não me sentiria no direito de contestar a prática utilizada. Sei que tem muita gente dentro do PT querendo renovar. Ontem recebi dezenas de telefonemas de pessoas do Brasil inteiro, de amigos meus da bancada de deputados, amigos meus dos ministérios da presidente Dilma e todos fazendo apelo para que eu continuasse. Expliquei para todos eles que esse meu gesto não é apenas uma proclamação, mas que é uma tentativa de fazer as pessoas do PT e da política refletirem sobre o fato de que há gente que não aceita o vale-tudo. Então, estou entregando o meu cargo de secretário, devolvendo ao partido o meu mandato, renunciando ao mandato de deputado, para que meu gesto às pessoas continuem renovando o PT.

MANDATO


Essa foi uma parte da decisão dolorosa que tomei. Não atenderia as expectativas s continuasse no mandato, estaria esvaziando as expectativas. Teria que sair do meu partido, e sair do partido significa que você esvazia o conteúdo do mandato. Tive compreensão de que meu gesto é também na filosofia do mandato. As pessoas que votaram, votaram pelos ideais, de justiça popular, programa democrático popular, de apoio ao governo Dilma, Lula e Eduardo, apoio aos governos do PT, esse valores de ética na coisa pública, tudo isso espero contribuir. Nesses 10 anos de mandato, as pessoas que votaram em mim puderam testemunhar. Exerci o mandato com dignidade. Não fiz qualquer gesto que deslustrasse o mandato e a política, as condescendências. Não me acovardei nos momentos difíceis, como aqueles que os conservadores, de modo até golpista, queriam derrubar o presidente Lula, queriam interromper um projeto de inclusão social, que estava mudando a vida das pessoas. Foi um mandato respeitado e também agradeço a contribuição dada pelas pessoas que integram a equipe e nos fortaleceram.

PATRIMÔNIO

Ganhei muito dinheiro na advocacia antes de entrar no mandato de deputado federal e gastei uma parte muito grande daquele patrimônio que havia adquirido. Patrimônio todo regularizado, com os impostos pagos. Gastei muito desse patrimônio, diminuiu muito. Na última eleição, investi em alguns imóveis para que a tentativa no pleito não levasse o que sobrou, mas saio hoje com o patrimônio consideravelmente menor do aquele que tinha na advocacia. Basta ver que abandonei o escritório de advocacia. Não sou mais sócio do escritório e os meus ex-sócios tem patrimônios oito, dez vezes maiores que o meu. Mas não me arrependo.


RETORNO À VIDA PRIVADA


Esse meu gesto procura ser um gesto para que se busque renovar a política. Outros deputados também gostariam de fazer um gesto semelhante. Vejo e convivo lá na Câmara com pessoas que tem vocação para a política e, às vezes, não têm alternativa se não continuar na política. Esse meu gesto é possível. Posso recomeçar minha vida privada. Há casos de diversas pessoas que se dedicam a coisa pública, chegam a uma certa idade e não tem como retomar uma vida privada.
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Recife, Pernambuco, Brazil
Maurício Rands, recifense, advogado e professor universitário, 50 anos, casado, dois filhos, eleito em 2010 para o terceiro mandato de deputado federal, pelo Partido dos Trabalhadores, representando Pernambuco. Está licenciado do cargo. Atualmente, assume a Secretaria do Governo na gestão do governador Eduardo Campos.
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Labour Relations and the New Unionism in Contemporary Brazil

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